A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia: contribuições para o MERCOSUL

Tatiana Cardoso Squeff e Bianca Guimarães Silva 164 específica e abrangente ao consumidor, mas tão-somente menções esparsas, ligadas, inclusive, à visão do consumidor enquanto centro de um mercado (haja vista a sua atividade de consumir), e, logo, consideradas motivações prioritariamente econômicas em detrimento do indivíduo em si.13 Exemplo disso é constatável no Tratado de Roma de 1957, o qual instituiu a Comunidade Econômica Europeia (CEE), vez que as previsões existentes estavam: (i) no artigo 2, acerca da missão do bloco, o qual primaria pela construção de um mercado comum a fim de promover a melhoria do nível de vida dos habitantes dos seis países membros (Bélgica, Luxemburgo, Holanda, França, Itália e Alemanha) – o que indiretamente incluía certa proteção aos consumidores; (ii) no artigo 36, relativo às previsões que previam a impossibilidade de restrições quantitativas, as quais seriam permitidas quando voltadas à proteção da saúde e da vida das pessoas, desde que não sejam discriminatórias nem acobertem um comércio desigual entre os Estados-Membros, englobando indiretamente, assim, alguns dos princípios declarados por Kennedy; (iii) e no artigo 39, atinente à política agrícola comunitária, cujo objetivo, dentre outros, era de assegurar preços razoáveis aos consumidores de alimentos – contendo a única previsão direta à tutela dos consumidores. Contudo, justamente pela falta de previsões específicas no Tratado de Roma em relação à proteção da pessoa do consumidor é que a Comissão Europeia estabeleceu a Diretiva n.º 70/50, de 22 de dezembro de 1969, impedindo que os Estados-Membros adotassem uma série de medidas que pudessem prejudicá-los, como (i) a fixação de preços máximos/mínimos para produtos importados, (ii) a imposição de cauções ou outras formas de pagamento mais complicadas para produtos importados e (iii) restrições quanto à forma/dimensão de produtos provenientes de outros países não impostas no mesmo grau aos produtos domésticos.14 Seguindo essa linha, em 1975, ajustou-se o “Programa Preliminar da CEE [Comunidade Econômica Europeia] para uma Política de Proteção e Informação dos Consumidores” – exemplo de soft law que buscava alinhavar cinco direitos aos consumidores15 pertencentes ao bloco, já contando desde 1973 com Dinamarca, Irlanda, 13 FELLOUS, Byela Esther. Proteção do Consumidor no MERCOSUL e na União Europeia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 100-101. 14 Salienta-se, nesse viés, dois casos julgados pelo Tribunal de Justiça Europeu (TJE): o primeiro, “Dassonville [julgado em 11 de julho de 1974], relativo à exigência belga de um certificado de origem para a entrada de um scotch whisky em livre circulação na França”, e o segundo, ‘Cassis de Dijon’ julgado em 20 de fevereiro de 1979, referente à proibição alemã da venda de um licor francês por força do seu teor alcoólico, os quais contrariavam tal diretiva por estabelecer um tratamento discriminatório ao produto oriundo do estrangeiro. Especificamente no segundo caso referido, “o interesse do consumidor fora invocado enquanto exigência imperativa. No entanto, a Corte considerou que este interesse poderia ser eficazmente protegido por meio de informação adequada sobre a composição do produto na embalagem” (FELLOUS, op. cit., 2003, p. 102-106). 15 São eles: saúde e segurança, educação e informação, representação, proteção dos interesses econômicos e reparação de danos – os três primeiros idênticos aos proclamados nos Estados Unidos e os dois últimos atrelados aos fundamentos do bloco em prol da criação de um mercado interno comum (FELLOUS, op. cit., 2003, p. 107).

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