A evolução jurisprudencial do Tribunal de Justiça da União Europeia e a Carta de Direitos Fundamentais: de Roma a Lisboa 27 Por sua vez, a CEDH estabelece, no parágrafo 2 do seu artigo 6º, que “qualquer pessoa acusada de uma infração se presume inocente enquanto a sua culpabilidade não tiver sido legalmente provada”.30 Porém, o Advogado Geral traz a própria jurisprudência da Corte Europeia dos Direitos do Homem31 para defender que a Convenção autoriza os Estados signatários a se valerem de certas presunções de direito e de fato, desde que não ultrapassem um limite razoável, determinado pelos interesses em jogo e respeitando aos direitos de defesa.32 Trata-se de uma aplicação do princípio da proporcionalidade similar àquela do caso da CEDH em que o Advogado Geral se baseou, a saber, o acórdão Salabiaku contra França, que, na consideração nº 28 de sua fundamentação, declarou a mesma regra de proporcionalidade usada nas conclusões do Advogado Geral do caso Hansen. Tem-se aqui, aliás, não apenas uma análise dos princípios fundamentais no âmbito comunitário à luz da CEDH, mas um claro intercâmbio de princípios entre as duas Cortes. Finalmente, as ambiguidades jurisprudenciais relativas à discussão sobre as competências em matéria de proteção dos direitos fundamentais (também considerados e elevados à categoria de princípios gerais do direito europeu) terminaria com a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, ao reconhecer à Carta Europeia de Direitos Fundamentais efeito vinculante (art. 6º). Além disso, as tradições constitucionais comuns dos Estados-Membros e a inspiração dos instrumentos internacionais, nomeadamente a Convenção, também são citados no Tratado da União Europeia, no mesmo artigo 6º. Ainda, na esteira de Sarrión: Al fin y al cabo, la existencia de una radical separación entre ordenamientos no es sino un “espejismo”, y esta teoría o metodología nos puede servir para aprehender la articulación entre los diferentes niveles, sistemas o subsistemas de garantía de los derechos fundamentales que coexisten en la UE; sobre todo tras el Tratado de Lisboa que ha abierto un nuevo horizonte constitucional en la misma.33 30 CORTE EUROPEIA DE DIREITOS HUMANOS (CEDH). Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Estrasburgo: CEDH, 2 out. 2013. Disponível em: http://www.echr.coe.int/ Documents/Convention_POR.pdf. Acesso em: 25 jul. 2024. 31 Caso Salabiaku, acórdão de 7 de outubro de 1988. Ponto 28: “[...] O artigo 6,parágrafo 2 (art. 6-2) não se desinteressa pelas presunções de fato ou de direito encontradas nas leis repressivas. Ele ordena aos Estados que as mantenha dentro de limites razoáveis, considerando a gravidade da causa e preservando os direitos de defesa” (CORTE EUROPEIA DE DIREITOS HUMANOS (CEDH). Affaire Salabiaku c. France (Requête no 10519/83). Estrasburgo: CEDH, 7 out. 1988. Disponível em: http://hudoc.echr.coe.int/fre?i=001-62127. Acesso em: 25 jul. 2024. Tradução nossa). 32 TJCE, Conclusões do Advogado Geral Walter Van Gerven,... op. cit. 33 SARRIÓN ESTEVE, Joaquín. Supremacía constitucional y primacía del Derecho de la Unión Europea tras el caso Melloni. In: Baño León. J. M. (coord.). Memorial para la reforma del Estado: estudios en homenaje al Profesor Santiago Muñoz Machado, 2016. Tomo I, vol. 1, p. 201-220.
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