Jânia Saldanha 338 1º, atribuiu à ela essa condição. Nesse sentido, em 2009, ano da entrada em vigor do Tratado de Lisboa, a CDFUE deixou de ser um documento apenas político ou proclamatório para tornar-se juridicamente vinculativa para as instituições da União Europeia e para os Estados-Membros, quando estes aplicam o direito comunitário. Por exemplo, quando não se cumpre uma diretiva de forma a contrariar os direitos fundamentais, quando um Estado aplica uma lei europeia de forma contrária aos direitos fundamentais ou quando um tribunal nacional, ao proceder à interpretação de leis europeias, contraria os direitos fundamentais. A Carta incorporou no Preâmbulo as posições doutrinárias progressistas que defendiam a universalidade e indivisibilidade dos valores preconizados por ela, colocando o ser humano no centro de suas ações. É preciso considerar, também, que estando situados em um nível superior, esses direitos deveriam gozar de uma condição particular frente aos juízes das Cortes constitucionais e diante dos juízes internacionais, como afirmou Louis Favoreu.13 Essa afirmação, em princípio, indica que há uma concepção comum no sentido de que os direitos fundamentais exigem adaptação das ordens jurídicas internas, cujos juízes, principalmente das altas Cortes, devem respeitá-los e consagrá-los, assim como os juízes internacionais. Contudo, desde logo, é preciso dizer que essa não parece ser uma unanimidade nas atuações das altas Cortes dos Estados-Membros. De fato, por um lado, há a mobilização da CDFUE em países como Áustria, Bélgica, Espanha e República Tcheca, nos quais está situada ao lado das Constituições e compõe o quadro de instrumentos que proporcionam o controle de constitucionalidade.14 Laurence Burgorgue-Larsen, a propósito disso, noticia que a Áustria, por exemplo, coloca no mesmo nível de importância a Carta e a Constituição. Ela refere, por outro lado, que o sistema de controle de constitucionalidade francês se posiciona na direção oposta ao da Áustria, em razão da interpretação restritiva do art. 88, n. 1, da Constituição francesa, por meio da qual apenas as diretivas e os regulamentos são transpostos. Por isso, a CDFUE, o direito da União Europeia, dificilmente ingressam diretamente no sistema de controle de constitucionalidade. As posições diferentes que as Cortes constitucionais dos Estados-Membros adotam, seja quanto à interpretação, seja quanto ao estímulo aos diálogos jurisdicionais e, finalmente quanto à mobilização da Carta para fins estratégicos, evidenciam dissonâncias até hoje. 13 FAVOREU, Louis. Universalité des droits fondamentaux et diversité culturelle. In: L’effectivité des droits fondamentaux dans les pays de la communauté francophone. Colloque International Île Maurice, 29 septembre-1er octobre 1993. Montréal: Aupelf-Uref, 1994. Veja-se também: COUDERT, Céline. Réflexions sur le concept de fondamentalité dans le droit publique français. 2011. 481 f. Tese (Doutorado em Direito) – Université d’Auvergne – Clermont-Ferrand I, Bayonne, França, 2011. Disponível em: https://theses.hal.science/tel-01064280/ file/2011CLF10360.pdf. Acesso em: 30 maio 2024. 14 BURGORGUE-LARSEN, Laurence. La mobilisation de la Charte des Droits Fondamentaux de l’Union Européenne par les juridictions constitutionnelles. Conseil Constitutionnel, Titre VII, n. 2, abr. 2019. Disponível em: https://www.conseil-constitutionnel.fr/publications/titre-vii/la- mobilisation-de-la-charte-des-droits-fondamentaux-de-l-union-europeenne-par-les-juridictions. Acesso em: 2 jun. 2024.
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