Jânia Saldanha 344 destinadas aos residentes, amplia a base protetiva da própria Carta, limitada que é aos cidadãos europeus, para abranger os “residentes legais”. O problema que podemos identificar para que o efetivo gozo dos direitos acima mencionados seja concretizado, é a limitação prevista no Capítulo V, que trata da cidadania. Todos os dispositivos deste Capítulo mencionam a categoria do “cidadão europeu”, condição para o exercício dos direitos nele previstos. Então, chama a atenção o artigo 45. Esse disposto assegura o direito de livre circulação e permanência em qualquer Estado-Membro. Contudo, o mesmo direito resta limitado aos nacionais de países terceiros que, para deles tirar proveito, deverão estar no território europeu em condição “legal”. O direito ao trabalho e o acesso à segurança e assistência social quando reivindicados por uma pessoa na condição de “cidadão de Estados terceiros” restam severamente limitados. Isso ocorre não apenas a quem reivindica como sujeito principal, mas aos membros da família, como o comprova a farta jurisprudência do TJUE. Desse ponto de vista, se a condição de “estrangeiros sem papel” coloca-os na situação de “não cidadãos”, a liberdade de circulação também não é incondicionada para os “cidadãos europeus”. Então o exercício dessa liberdade é condicionada ao lugar de origem e, segundo a Diretiva nº 2004/38/CE29, é restrita para certos cidadãos europeus quando a permanência exceder o tempo de três meses. Ela é condicionada: a) à comprovação de recursos financeiros; b) à prova de exercício de uma atividade assalariada; c) ou à prova de matrícula em estabelecimento de estudos. O artigo 45 apresentou, desde o início dos trabalhos de elaboração da Carta, o problema relativo à identificação dos titulares desses direitos de “cidadania”. Esse problema de discriminação potencial, visto nos trabalhos de membros do “Praesidium” da Convenção que elaborou a Carta, poderia ser resolvido pela jurisprudência30 da Corte Europeia de Direitos Humanos. Mesmo que alguns afirmem que os direitos fundamentais previstos na Carta, sob a ótica de sua fundamentalidade, são um simples compromisso, pensamos o contrário. Malgrado a heterogeneidade que se vê, com inserção do direito ao trabalho no capítulo das liberdades, a reunião no texto entre os direitos civis e políticos (Títulos I a III e VI) – dignidade, liberdades, igualdade e justiça – com os direitos sociais (Títulos IV, V) – solidariedade e cidadania – a fundamentalidade desses direitos adquire contornos de materialidade porque desaguam de fontes europeias que 29 UNIÃO EUROPEIA (UE). Diretiva n.º 2004/38/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados-Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.º 1612/68 e que revoga as Diretivas n.ºs 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/ CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE. Estrasburgo, 29 abr. 2004. Jornal Oficial da União Europeia, n. L 229, p. 35-48, 29 jun. 2004. Disponível em: ht tps://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2004:229:0035:0048:PT:PDF. Acesso em: 4 jun. 2024. 30 PAULET, op. cit., 2021, p. 9.
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