A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia: contribuições para o MERCOSUL

Jânia Saldanha 346 importantes consequências sobre o exercício do acesso à justiça dos titulares desses direitos. Note-se que ante à categorização dos beneficiários, muitas pessoas terão o reconhecimento desses direitos a seu favor de maneira limitada ou não o terão em relação a outras categorias de pessoas. A jurisprudência do Tribunal de Justiça atesta essas diferenças, como se verá. Por agora, cabe mencionar que o artigo 51, nº. 1, da Carta estabelece essa dificuldade ao mencionar que os Estados devem “respeitar” os direitos e “observar” os princípios. Seriam os direitos sociais “princípios” de modo a serem apenas “observados” pelos Estados? Cassandra Paulet destaca que sim, a alusão a princípios corresponde aos direitos sociais e econômicos. E por que é assim? Depois de lembrar da tensão que permeou o trabalho da Comissão encarregada de elaborar o projeto da Carta, dividido entre o grupo de Estados que defendiam a inclusão desses direitos, como a Itália e França e o outro grupo, que os rejeitavam, como o Reino Unido e a Dinamarca, a autora destaca que a atribuição da natureza de princípios decorreu da influência da Alemanha, em cuja ordem jurídica os direitos sociais não são considerados direitos fundamentais em razão da dificuldade que apresentam ao sistema de justiça ao serem judicializados. A consequência, segundo ela, é esses direitos teriam invocabilidade restrita uma vez serem dependentes de ações concretas para judicializá-los. De fato, parece que a regra do artigo 52, nº 5, foi redigida justamente para realizar essa adequação. Assim, além de referirem-se apenas ao direito da União, sua jurisdicionalidade deve estar fundamentada na interpretação e fiscalização de sua legalidade. Contudo, mesmo que a prática da jurisprudência do Tribunal de Luxemburgo evidencie que a aplicação dos direitos sociais tem sido analisada pelo viés de sua materialidade e efetividade, então, para além da mera interpretação ou legalidade, no confronto com os direitos civis e políticos, como é o caso do direito de estabelecimento comercial voltado ao desenvolvimento econômico da integração, os direitos sociais têm ficado em lugar secundário e, como será visto, esse fenômeno tem afetado o direito dos trabalhadores migrantes deslocados, por exemplo. Do ponto de vista histórico, como já mencionado anteriormente, a CDFUE é um texto fundamental da ordem jurídica comunitária. Ela é um importante sustentáculo para a concretização dos valores da União Europeia e, do ponto de vista de sua legitimidade formal, se inspirada no constitucionalismo, promove a autolimitação dos poderes dos Estados-Membros. Na perspectiva supranacional, ela consagra direitos fundamentais que estão na ordem do dia das demandas do século em curso, como é o caso da proteção ambiental e dos dados pessoais. Mas devemos perguntar se ela tem contribuído efetivamente para melhorar a proteção dos direitos fundamentais na União Europeia? E, em seguida, perguntar qual é o papel dos direitos fundamentais no espaço integrado? Para isso é preciso olhar, ainda que de maneira parcial e muito reduzida, para a jurisprudência do TJUE e para a ambivalência do regime jurídico da Carta, pois, segundo a análise realizada por Antoine Bailleux33, os direitos fundamen33 BAILLEUX, op. cit., 2018, p. 583.

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