A Carta de Direitos Fundamentais e a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia sobre trabalhadores migrantes deslocados 353 que tais cláusulas eram mais favoráveis para os trabalhadores, mas que a Diretiva nº 2001/23/CE, cuja aplicação se discutia, não se destinava apenas a proteger os interesses dos trabalhadores, mas sim a garantir um equilíbrio justo entre os interesses da empresa e os dos empregadores. O Tribunal aplicou a liberdade de empresa prevista no artigo 16 da Carta da União Europeia, especificando que o litígio atingia em particular a liberdade contratual e que estaria sendo ofendida a essência da liberdade empresarial. Derivado desta interpretação da Diretiva de harmonização mínima, o artigo 16 da Carta também assim interpretado, passou a enfraquecer o direito dos Estados-Membros de tomarem medidas mais favoráveis aos trabalhadores. Note-se que, voltando ao tema da fundamentalidade dos direitos previstos na CDFUE, a redação do artigo 16 menciona “liberdade” de empresa e não “direito”. Essa menção faz questionar a jurisprudência por colocar a liberdade em situação superior aos direitos dos trabalhadores. Mas, se a heteronomia for deixada de lado por entender-se que todas as previsões são direitos fundamentais, ainda há de ser questionado o desequilíbrio visível que tal precedente causa entre os interesses econômicos e os direitos sociais. Este artigo estabelece que o exercício da liberdade está sujeito ao direito da UE, ao dos Estados-Membros e às práticas nacionais. Seja “liberdade” ou “direito”, de qualquer sorte, seu exercício não é ilimitado. Ao contrário, deve estar alinhado com o direito comunitário, com o direito interno e com as práticas nacionais. O que a jurisprudência do TJUE deixa entrever, portanto, é a existência de um desequilíbrio entre o direito dos trabalhadores e o dos empregadores na União Europeia, em especial, como foi demonstrado, quando os trabalhadores são migrantes internos deslocados. Para Garben49, o papel do Tribunal de Justiça deveria ser o de aplicar os direitos fundamentais a fim de garantir condições necessárias para uma democracia sólida e durável, capaz de garantir o respeito à igualdade e, com isso, corrigir as injustiças sociais. O autor, nesta perspectiva, propõe quatro caminhos possíveis: a) a liberdade de empresa, na condição de um direito humano, não deve servir de espada contra os direitos dos trabalhadores; b) o conflito entre os direitos à igualdade transnacional que derivam do mercado interno e os direitos fundamentais deve ser analisados com foco no respeito à democracia tanto em nível nacional quanto em nível comunitário; c) é o processo democrático que deve dar corpo aos direitos dos trabalhadores contra as decisões das empresas que lhes possam causar prejuízos; d) o direito de greve e a negociação coletiva têm um papel importante na criação e manutenção de uma democracia sólida. 4. Conclusão Malgrado a seletividade dos beneficiários e a heterogeneidade da categorização dos direitos presentes no texto da CDFUE que pode provocar desarmonia interpre49 GARBEN, op. cit., 2020, p. 69-70.
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