A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia: contribuições para o MERCOSUL

Luciane Klein Vieira 42 Em 1974, com o caso Nold, o Tribunal de Justiça decidiu ampliar o âmbito de aplicação do princípio geral de proteção aos direitos e garantias fundamentais, passando a abarcar além das previsões constantes nos textos constitucionais os instrumentos internacionais de proteção aos direitos humanos que foram objeto de ratificação ou adesão pelos Estados-Membros. Sendo assim, conforme o Tribunal de Justiça: [...] os direitos fundamentais são parte integrante dos princípios gerais do direito, cuja observância lhe incumbe garantir. O Tribunal, ao garantir a protecção destes direitos, deve inspirar-se nas tradições constitucionais comuns aos Estados-membros e não pode, assim, admitir medidas incompatíveis com os direitos fundamentais reconhecidos e garantidos pelas constituições destes Estados. Os instrumentos internacionais relativos à protecção dos direitos do homem, em que os Estados-membros colaboraram ou a que aderiram, podem igualmente dar indicações que é conveniente tomar em consideração no âmbito do direito comunitário.28 Como se observa, a jurisprudência do Tribunal em matéria de direitos fundamentais obteve um desenvolvimento29 paulatino, marcado pela transição entre uma postura mais restritiva de direitos, adotada nos anos 60, para outra mais abarcadora, a partir dos anos 70. Os casos analisados nesta década demonstraram que a instituição passou a considerar tais direitos como um parâmetro de interpretação, na medida em que foram elevados à categoria de princípio geral do Direito Comunitário, preenchido pelos valores contemplados nas disposições constitucionais comuns aos Estados- -Membros e pelos instrumentos internacionais de direitos humanos. Pese a isso, esse critério hermenêutico esteve adstrito a situações nas quais se buscou, inicialmente, proteger “os particulares contra a actuação dos órgãos comunitários que lesassem os seus direitos”.30 Posteriormente, operou-se a ampliação deste posicionamento, tendo sido estendido o âmbito de aplicação pessoal para situações nas quais a violação de direitos fundamentais tivesse sido causada por instituições dos próprios Estados-Membros, mas que de alguma forma permitiam o controle pelo Tribunal de Justiça quando configurada uma das seguintes circunstâncias: a) promoção da adoção de medidas 28 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (TJCE). Acórdão “J. Nold, Kohlen- und Baustoffgroßhandlung contra Comissão das Comunidades Europeias” (Processo C-4/73). Luxemburgo: TJCE, 14 maio 1974. Disponível em: https://curia.europa.eu/juris/ showPdf.jsf?text=&docid=88495&pageIndex=0&doclang=pt&mode=lst&dir=&occ=first&part =1&cid=4587271. Acesso em: 21 maio 2024. 29 Para mais detalhes sobre o tema, ver: FABBRINI, Federico; LARIK, Joris. The Past, Present and Future of the Relation between the European Court of Justice and the European Court of Human Rights. Forthcoming in 35 Yearbook of European Law, iCourts Working Paper Series n. 37, 2016. Disponível em: https://ssrn.com/abstract=2697513. Acesso em: 23 maio 2024. 30 SOARES, op. cit., 2002, p. 14.

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