Raphael Carvalho de Vasconcelos e Celso de Oliveira Santos 534 inspiração no modelo mercosulino ao dispor que a suspensão de um Estado por aplicação da cláusula democrática implica na suspensão dos direitos decorrentes da participação, embora mantendo as obrigações contraídas, sobretudo em matéria de direitos humanos. A proposta de prever uma reação institucional da organização regional à ruptura da ordem democrática é tão sedutora quanto ambígua, se desacompanhada de parâmetros para a identificação das hipóteses em que se as deve aplicar. No entanto, pode ter sido conveniente manter as disposições normativas, na pior das hipóteses, porque facilita a criação de uma aparência de normalidade, ou, de outro lado, na melhor delas, amplia o leque de possibilidades para a sua subsunção – fato é que, a despeito disso, atingiu-se consenso favorável à sua formulação. Outra coisa é a sua aplicação nos casos concretos em que se observaram perturbações da ordem democrática, o que, dada a natureza dos órgãos incumbidos de deliberar sobre a sua aplicação, exige igualmente o atingimento de um consenso entre os Estados-Membros, e, por conseguinte, um mínimo alinhamento entre os interesses dos governos que momentaneamente os representam perante a institucionalidade. Em outras palavras, tanto no MERCOSUL quanto na OEA, os órgãos dotados de poder para decidir quando uma perturbação democrática o é (e quando não o é) são compostos sob critérios estritamente políticos e não estão vinculados a nenhum critério técnico para fundamentar tal decisão, muito embora haja abundante delineamento tanto normativo quanto doutrinário que os pudesse guarnecer. No caso específico do MERCOSUL, também merece destaque o fato de que a aplicação da cláusula democrática no contexto da suspensão do Paraguai resultou, em 2012, em Procedimento para Atender Casos Excepcionais de Urgência ao Tribunal Permanente de Revisão (TPR), cujo mérito o laudo arbitral não analisou, uma vez que se considerou que na demanda não se verificavam os requisitos que devem necessariamente concorrer para a admissão do procedimento de atendimento de casos excepcionais e de urgência (que necessariamente devem versar sobre “bens perecíveis, sazonais ou de curta durabilidade”), nem tampouco havia concordância dos Estados demandados com o acesso direto à jurisdição do TPR. Por outro lado, o Tribunal afirmou sua competência para a matéria, que, embora não tenha natureza comercial, tem sim fulcro em normativa MERCOSUL vigente e vinculante. Mais importante ainda é o fato de que o laudo, ao fundamentar a inadequação das vias procedimentais provocadas pela representação do Paraguai no caso, detalhou qual seria a via adequada para contestar jurisdicionalmente a aplicação da cláusula democrática em desfavor de um Estado Parte, que necessariamente deveria solicitar negociações diretas nos termos do art. 4º do Protocolo de Olivos. 4. O Momento do MERCOSUL Em 2021, foi celebrado o aniversário de 30 anos do MERCOSUL. Mesmo os críticos mais contundentes precisam reconhecer que essa organização internacional
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