259 Mauricio Dal Castel der não se manifesta mais como o poder do soberano sobre a morte. A partir de então, o filósofo francês cunhou de biopoder, ou poder biopolítico, o poder que é exercido através do estímulo, do fortalecimento, da vigilância, dos ajustes comportamentais sobre a população – a massa de sujeitos reunidos, característico da sociedade disciplinar. O biopoder, portanto, é exercido de forma mais refinada, discreta, inferindo nos processos e leis biológicas para guiar e conduzir a população. Entretanto, para Han, o controle biopolítico é adstrito apenas a fatores e comportamentos externos, como a reprodução, taxa de mortalidade, saúde pública, controle da criminalidade, não sendo apto a intervir nos processos psicológicos, na psyche, dos sujeitos por ele afetado, tampouco apto a conhecer e revelar os seus pensamentos. Exemplifica o autor com a analogia do panóptico benthamiano, amplamente trabalhada por Foucault, onde a vigilância exercida incidiria apenas no comportamento externo dos prisioneiros, enquanto os seus pensamentos permaneceriam disponíveis somente a eles (Han, 2018, pp. 129-130). A biopolítica consiste na técnica de administração e governança da sociedade disciplinar, mas, segundo o autor sul-coreano, seria inadequada para o regime neoliberal que explora, principalmente, a psyche, uma vez que a biopolítica se restringe a estatísticas demográficas, a amostragens, e, assim, não detém acesso ao psíquico, não fornece um psicograma da população Justamente neste ponto reside uma das principais diferenças entre a estatística e o big data, principal instrumento psicopolítico: a estatística não adentra na psyche do sujeito, enquanto o big data é capaz de extrair não apenas o psicograma individual do sujeito, mas também o psicograma coletivo da população (Han, 2018, pp. 33-36). Contudo, hoje, o poder seria exercido de forma ainda mais abrangente do que o poder biopolítico outrora identificado por Foucault. Agora, o poder é exercido não apenas sobre os corpos dos sujeitos e incidindo no seu comportamento externo enquanto sujeitos e no comportamento coletivo enquanto população. Agora, o poder de controle viabilizado pela tecnologia incidiria, também, sobre a psyche, sobre a mente dos sujeitos. Aduz o autor: Hoje uma nova mudança de paradigma se realiza. O panóptico digital não é uma sociedade disciplinar biopolítica, mas sim uma sociedade da transparência psicopolítica. E, no lugar do biopoder, entra o psicopoder. A psicopolítica está em posição para, com ajuda da vigi-
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